Ana Falcão apresenta um ponto de vista diferente sobre o papel de transformação da comunicação nas cidades.
Como gestora de tráfego na internet e empreendedora, ela acredita que o “digital” pode contribuir para que o “real” seja mais próspero e acolhedor.
Hoje, Ana dedica-se ao seu sonho, de transformar o mundo conectando as pessoas.
1 – Qual o papel da comunicação na consolidação do projeto de Cidade Humana?
Ana Falcão – Imagina um mundo sem comunicação. Sem comunicação nenhuma. Não dá, né? Fica até difícil de imaginar, porque sem comunicação não tem nada. A comunicação é o veículo de absolutamente tudo. Você pode fazer um trabalho incrível ou ter uma ideia ou um projeto fantástico que mudaria a vida das pessoas. Mas se ninguém ficar sabendo, ele não vale absolutamente nada.
Claro que isso é um exemplo extremo. Mas, do outro lado, a gente tem o que seria uma comunicação plena. Uma utopia onde tudo que você precisa saber chega fácil e rápido até você. Você pensou em algo, você encontra. Você precisa saber de alguma coisa, já achou. Você tem alguma necessidade ou carência e nem sabe como resolver, já descobre. Você encontra seus familiares, amigos e pessoas queridas sempre que quiser. A sua mensagem também chega e, por conta disso, a cidade atende o indivíduo e é boa para as pessoas. Nesse cenário, você não tem absolutamente nenhuma restrição de comunicação.
O mundo real está no meio do caminho. Numa linha onde, de um lado é o caos total e de outro a comunicação plena. Tem um caminho enorme a ser percorrido, porque mesmo com a internet, redes sociais, whatsapp, inteligência artificial e tudo mais, a gente está muito mais perto do caos do que da comunicação plena. Mas eu tenho certeza que, quanto mais as pessoas puderem se comunicar de uma forma clara e eficiente, mais perto da cidade humana a gente chega.
2 – Como usar a comunicação na era da tecnologia para divulgar os potenciais da cidade e sua identidade cultural?
Ana Falcão – Você pode até pensar que a internet afastou as pessoas, que criou barreiras e que todo mundo dá mais atenção para o celular do que para as pessoas ao redor. Eu até entendo isso, mas vejo de uma forma muito diferente. Tenho uma visão muito positiva sobre a tecnologia e acho, inclusive, que ainda estamos engatinhando.
Hoje existem vários canais de comunicação diferentes, como Google, Youtube, Instagram, Facebook, TikTok, Twitter, Threads, etc, onde qualquer pessoa pode ser um produtor de informação. Há 10 anos, isso não era tão fácil. 20 anos atrás era bem complicado. 30 anos atrás, a comunicação para audiências maiores era exclusividade grandes grupos, não à toa chamados de meios de comunicação.
Mas por que eu acho que ainda estamos engatinhando? Se a informação hoje flui de uma forma incrivelmente diferente de 10 anos atrás e totalmente acelerada, nosso cérebro ainda é biologicamente o mesmo de quando surgiu, há 300 mil anos. A gente ainda não aprendeu a pensar a comunicação em todas as suas possibilidades.
As pessoas podem estar neste exato momento precisando de alguma informação que você sabe ou de algo que você pode oferecer. A questão é que você pode ser, saber ou fazer o que for, mas se você não comunicar pouco importa. E a comunicação tem o poder de resolver problemas das cidades, aproximar as pessoas e realizar potenciais.
Algo que me incomodo muito é que sempre é difícil encontrar lugares para ir. Seja um restaurante, algum serviço que você precisa no dia a dia, seja o planejamento de uma viagem em uma outra cidade. Os municípios não sabem divulgar seu potencial turístico, não conseguem mostrar seus museus, praças, pontos turísticos, locais de lazer, cafés, monumentos, cachoeiras, parques, etc, etc. Aí acontece que as pessoas que estão dispostas a conhecer – e a gastar dinheiro – acabam indo embora frustradas. Isso vale também para quem mora na própria cidade e acaba frequentando sempre os mesmos lugares.
Estou falando de experiências reais, de economia girando, de negócios locais que podem se consolidar projetando seu nome para além da cidade onde estão. São oportunidades incríveis de transformar as cidades, fortalecer as identidades culturais, gerar negócios, fortalecer a economia e transformar a vida das pessoas. A gente só precisa aprender a pensar diferente.
3 – Quais opções práticas temos hoje disponíveis para divulgar negócios locais, turismo, gastronomia? E qual a relação de uma ação pontual de uma empresa local com o conhecimento sobre a cidade fora dela?
Ana Falcão – A primeira ação prática é escolher o seu canal de comunicação. Você pode ter um blog, você pode ter um perfil no Instagram, que você alimenta com o que tem de melhor, com seu cotidiano, com informações interessantes e sempre pensando que do outro lado existe um ser humano também. Então você precisa criar aquele conteúdo pensando se o outro lado vai compreender e pegar a informação. Por isso, escolher uma rede social, escolher um canal de comunicação é essencial nessa primeira fase. É a primeira coisa que um negócio local ou uma frente de trabalho dentro da cidade precisa fazer. Hoje, a maior parte das prefeituras já tem Instagram, algumas têm canal no YouTube, algumas têm página no Facebook e isso vai além da ação política. Um negócio local, que por exemplo fabrica um doce típico da cidade, ele tem a rotina dele, a qualidade dos ingredientes, ele tem muita informação para passar. Ele tem que ser consistente, isso não significa publicar todos os dias, mas precisa ter uma certa periodicidade, pelo menos duas vezes por semana. Você está com o celular na mão, faça stories, descubra como aquele perfil pode ser visto pelas outras pessoas. Use uma linguagem que todos vão entender. Se você tiver dúvida se as pessoas estão entendendo, mostre seu conteúdo para uma criança ou para um idoso. Se eles não entenderam, você precisa repensar o que disse.
Isso é só o começo, é claro. Mas o importante é dar o primeiro passo, adquirindo consciência de que a comunicação é a base de tudo. As ações só vão reverberar em resultado se começarem.
4 – O indivíduo pode participar da comunicação de uma cidade? O que precisa mudar na mentalidade da cidade e do cidadão para que a comunicação se torne ativa e única?
Ana Falcão – Isso está intimamente ligado ao empreendedorismo. E tem duas esferas, a de quem produz conteúdo e a de quem consome. Mas estes papéis não são fixos. Todo mundo que oferece algo, na verdade está no papel de consumidor na maioria do tempo.
Na esfera de quem produz conteúdo, se você tem um negócio você precisa começar posicionando sua empresa, sua marca, seu produto ou serviço de uma forma que as pessoas encontrem você com mais facilidade. Você precisa ter um site, ter redes sociais, aparecer com frequência, nem que seja só um pouquinho no começo. E, de preferência, fazer anúncios. Só assim que sua mensagem vai chegar para quem precisa.
Pensando no lado de quem consome – inclusive, quem oferece algo está no papel de consumidor na grande maioria das vezes – existe uma atitude. Consumir não é mais um papel passivo. O consumidor, seja de informação ou de produtos, tem um papel central na sociedade e na cidade. A opinião do consumidor é vista e valorizada, até mais do que reviews de mídias especializadas, por exemplo. Quando o consumidor posta, marca, revisa, descreve, avalia, ele passa a ter um papel ativo que certamente vai ajudar outras pessoas e, inclusive, as empresas. O Brasil é hoje o país onde os produtores de conteúdo mais influenciam decisões de compras. Isso é uma oportunidade incrível e um indicativo fantástico de que temos potencial para a cidade humana.
Eu acho todo esse cenário fascinante! Para quem quer empreender, existem inúmeras oportunidades.
5 – Existem exemplos exitosos que geram alcance e informação sobre cidades de forma que a identidade se sobressaia para nos inspirar?
Ana Falcão – Vou aproveitar a pergunta para complementar a questão anterior. Toda vez que você perceber uma lacuna, que você sentir que falta informação ou que algo poderia ter sido mais fácil é porque existe uma oportunidade. Qualquer pessoa pode criar conteúdo indicando caminhos e facilitando a vida de outras pessoas. Existem inúmeras pessoas que fazem isso pelo mundo todo, não apenas com relação às cidades especificamente, mas sobre qualquer coisa. Vou citar alguns que gosto e acompanho:
Tem o @sampadicas da cidade de São Paulo, por exemplo. Se você entra no perfil, sabe onde tomar café da manhã, onde almoçar, qual parque está tendo evento, entre muitas outras informações.
@sampasky é um prédio turístico que você consegue tirar fotos dentro de um cubo de vidro que fica para fora do prédio, como se estivesse flutuando com a cidade de São Paulo no fundo. O trabalho é muito legal e as pessoas marcam e eles repostam.
Tem uma interessante que são mães indicando locais para passear com os filhos e assim surgiu o @kids.porai. Elas começaram a ir nos lugares onde tem espaço Kids na cidade e publicam informações do local. No caso delas, elas estão criando um canal com grandes possibilidades de convites para que suas visitas sejam divulgadas e publicadas no canal que elas criaram.
Então, a partir de uma ação individual as pessoas vão conhecendo a cidade.
Se você trabalhar a cidade dentro da internet de forma consistente, com coerência e com intenção, você consegue fazer com que sua cidade, com suas características únicas, identidade cultural forte, possa ser usada para atrair pessoas. Porque você tem um conteúdo importante para passar. Precisamos organizar pensamentos, intenções e assim podemos a partir do indivíduo mostrar nossa cidade para o mundo.