Patrimônio Cultural é muito mais do que prédio antigo

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Os bens culturais caracterizam-se como as expressões tangíveis e intangíveis resultantes de diferentes modos de vida. São formas de expressão, modos de criar, fazer e viver que constituem a base da diversidade cultural brasileira. Contudo, nem todos os bens são ou virão a ser registrados como patrimônio cultural, ou seja, como objeto de políticas públicas de preservação de um município, estado ou União. Aqueles selecionados para compor o acervo de uma coletividade precisam fazer referência à identidade, à memória e à história dos variados grupos formadores da nação brasileira, como define o artigo 216 da Constituição Federal. Ao reconhecer um bem como patrimônio cultural, o governo e a sociedade tornam-se corresponsáveis por ele, devendo garantir a sua promoção e proteção, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento, desapropriação e de outras formas de acautelamento e preservação.

De uma maneira geral, o patrimônio cultural pode ser dividido de acordo com a sua natureza material ou imaterial. No caso do patrimônio material, ele se subdivide em bens móveis (coleções e acervos bibliográficos, documentais e artísticos) e bens imóveis (sítios arqueológicos, conjuntos arquitetônicos (rurais e urbanos), edificações individuais, equipamentos e infraestrutura urbana, jardins históricos, paisagens e ruínas). Historicamente as edificações têm sido a categoria que ganhou maior atenção por parte do poder público, representando a maior parte dos bens tombados no Brasil. Não é de estranhar que o cidadão associe, normalmente, a ideia de patrimônio com “prédios antigos”.

Diante dessa realidade, o grande desafio dos entes federativos (União, estados e municípios) tem sido ampliar o acervo de bens preservados, incluindo o patrimônio imaterial, representado pelos saberes e fazeres (formas de expressão, ofícios e modos de fazer, celebrações e lugares). Essas expressões culturais intangíveis, como danças, músicas, ritos, entre outros, estão intrinsicamente ligadas aos grupos responsáveis por sua criação e execução. A referência, neste caso, só faz sentido a partir daqueles que lhe atribuíram significado: grupos formadores na nação brasileira. Isso significa que é preciso identificar e proteger não apenas os bens culturais, mas também as identidades produtoras desses bens.

Esse desafio também está posto para Ribeirão Preto. O Conselho de Preservação do município, o CONPPAC, com todos os revezes que tem sofrido, desenvolveu um árduo trabalho, contabilizando, em 2014, 75 processos de tombamento (em andamento e conclusos, tanto pelo município quanto pelo estado de São Paulo). Contudo, desse total, 73 são bens de natureza material e dois são bens imateriais. A maioria é composta por palacetes, fábricas, prédios públicos, conjuntos arquitetônicos ferroviários e industriais, além de arte tumular. Embora seja necessário frisar a importância de preservar esses bens, é preciso destacar que muitos grupos formadores do município não estão sendo representados de maneira equitativa numa política que lhes garanta o direito à memória. Essa falta de representação, aliada à ausência de conhecimento sobre o tema, acabam dificultando o envolvimento de grande parte da sociedade em defesa do patrimônio.

Para alterar esta situação é necessário considerar a realidade social como essencialmente multicultural e enfrentar o desafio de pensar o patrimônio como herança cultural viva. É esse espírito que precisa inspirar o poder público municipal e a sociedade civil. Juntos, devemos realizar um esforço para diagnosticar e valorizar os grupos produtores de cultura e proteger as referências importantes para a identidade de cada um. Só assim a política pública de patrimônio cultural será realmente representativa e democrática.